A tempestade perfeita: a Crise Climática e a Crise do Capitalismo

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O capitalismo está em xeque. A guerra tarifária disparada pelo governo Trump paralisa os negócios de um lado e, de outro, prejudica uma infinidade de redes e instituições que, até então, trabalhavam globalmente de maneira coordenada para ora amenizar os efeitos sociais das crises e guerras, ora para gerar conhecimento, ora para prestar ajuda humanitária.

Será que estamos vivendo o que podemos chamar de tempestade perfeita?

Vejamos: uma tempestade perfeita, derivado do inglês perfect storm, descreve uma situação não favorável, que é drasticamente agravada por uma série de combinações e que se transformam em um desastre.

Pois bem, com todas as consequências das políticas dos EUA na atual gestão, temos visto reações adversas no mundo todo, governos e empresas alterando políticas, estratégias e formas de condução do dia a dia.

Se somarmos as atuais guerras causadas pelas tarifas e outras políticas restritivas e protecionistas dos EUA à crise climática que já vinha se agravando, com prováveis efeitos dominó sobre os limites planetários, há de se pensar que a janela para agir se restringiu mais ainda.

Em breve, poderemos ver, na prática, os efeitos nas emissões de gases de efeito estufa, por exemplo, causada pela atual política tarifária; assim como as consequências negativas para a biodiversidade.

Já no então governo Biden eram consideradas insuficientes as ações para colocar o país dentro de uma trajetória de 1,5C até 2100. Isso associado com o “Inflation Reduction Act”, ainda em vigor na época, programa que ia na direção de ações para descarbonizar a economia.

O último cenário que temos é de novembro de 2024:

Conteúdo do artigo

Fonte: https://climateactiontracker.org/countries/usa/

Portanto, a crise climática agravada aliada à crise do capitalismo afetada pelo clima e pela guerra tarifária global combinam ingredientes para criar uma tempestade perfeita.

E o que podemos fazer a respeito? Disseminar esse conhecimento torna-se uma obrigação. Agir dentro do raio de sua influência é igualmente um chamado irrecusável.

Seja você um cidadão, morador da cidade ou do campo, trabalhador corporativo ou autônomo, servidor público, estudante etc., cada um tem um papel crucial na sociedade.

Vamos analisar aqui as consequências atuais de um dos setores para exemplificar: o de seguros.

Ninguém melhor que o mercado financeiro para saber quanto custam as perdas de um determinado negócio que previa crescer a um determinado patamar, mas, por não prever adequadamente um desastre climático, as perdas serem incalculáveis e sem possibilidade de serem indenizadas.

Esse problema só irá se agravar. Dependemos enormemente da aceleração das mudanças e elas são de responsabilidade de todos os atores da sociedade, empresas, governo e cidadãos, como falamos anteriormente.

A matéria do The Guardian – a seguir, que analisa a afirmação de Gunther Tallinger, Presidente do Conselho de Administração da Allianz, uma das maiores seguradoras do mundo – o qual disse que a crise climática está a caminho de destruir o capitalismo.

https://www.theguardian.com/environment/2025/apr/03/climate-crisis-on-track-to-destroy-capitalism-warns-allianz-insurer

O artigo explica, claramente, que o calor extremo e as inundações destroem capital. Casas submersas perdem valor. Cidades superaquecidas são inabitáveis. Classes inteiras de ativos estão degradando em tempo real.

Tais ativos estão se tornando impossíveis de serem segurados, a exemplo das casas na região da Califórnia recentemente atingidas por um incêndio de proporções gigantescas e com perdas incalculáveis.

O setor de seguros é interessante ser analisado deste ponto de vista, pois a gestão de riscos está no cerne da sua atividade.

Riscos climáticos

Uma correlação inexorável entre o setor de seguros e o mercado financeiro é a disponibilidade de recursos para setores cuja viabilidade de serem segurados se torna nula. Nesse caso, o capital não estará mais disponível para tais setores. Eles serão estrangulados. E esse fenômeno já vem ocorrendo.

O mercado financeiro precifica tais riscos. O valor econômico de regiões inteiras, costeiras, sujeitas a incêndios e inundações, por exemplo, não terão mais acesso a capital. Ele simplesmente foge do risco não previsível e cujo preço não será pago pelo retorno do capital investido.

Incorporar os riscos climáticos decorrentes dos riscos físicos e de transição, em uma perspectiva de curto, médio e longo prazos, é uma das grandes expectativas das normas IFRS S1 e S2. Mas por quê?

Justamente para que a materialidade financeira – aquela cujos temas são essenciais para gerar valor ao longo do tempo – esteja, de forma transparente, apresentada na forma de gestão; incorporada na estratégia e na gestão de riscos; supervisionada por uma governança robusta; e acompanhada por metas e métricas ao longo do tempo.

Esse é o principal clamor do mercado financeiro via regulador e que vem sendo orquestrado e implementado nas jurisdições pelo mundo.

O Brasil foi pioneiro. A partir do ano que vem, 2026, as companhias precisam construir seus relatórios conectados às demonstrações financeiras para reportar no primeiro semestre de 2027. Cada requisito respondido de acordo com as normas IFRS S1 e S2 precisa estar refletido nas demonstrações financeiras.

Vimos algumas empresas e profissionais buscando letramento desde 2024 e outras já indo na direção de um diagnóstico de gapsem relação às novas normas. É preciso agir, não apenas pela obrigação regulatória, mas também pelos motivos expostos neste artigo.

Adiar ou evitar a tempestade perfeita está em nossas mãos.