Palavra da Curadora
A COP30 em Belém terminou, mas é como se ainda ecoasse no ar, não só pelos debates (às vezes acalorados) mas também pelo jeito brasileiro de destravar conversas difíceis.
A diplomacia amazônica fez escola: reconectou países, tirou poeira de temas engavetados e trouxe de volta a sensação de que alguém precisa topar começar.
E o Brasil topou. O interessante é que, mesmo sem vitória perfeita (como o tão esperado roadmap dos fósseis), Belém inaugurou um ciclo: o da implementação pragmática. O legado está menos no “texto final” e mais no “movimento” iniciado.
No mundo em que cada item da pauta climática vira disputa geopolítica, a COP de Belém funcionou como uma espécie de ponte: improvisada às vezes, firme o suficiente para que a COP31, na Turquia, nascesse com rumo.

O que realmente saiu da COP30 no Brasil
A 30ª Conferência do Clima da ONU (COP30), realizada em Belém (PA) entre 10 e 21 de novembro, foi um evento de grande expectativa, especialmente por ocorrer na Amazônia.
O encontro consolidou um pacote de 29 decisões, conhecido como “Pacote de Belém”, projetando a liderança brasileira e inaugurando o conceito de um Mutirão Global contra a mudança do clima.
Contudo, ao analisarmos os resultados de forma imparcial, percebemos que a conferência terminou com decisões consideradas insuficientes diante da gravidade da crise climática.
As forças entre o Norte e o Sul Global, entre países desenvolvidos e em desenvolvimento, ficaram evidentes e geraram impasses.

Apesar das tensões geopolíticas, a COP30 alcançou seus três objetivos principais: fortalecer o multilateralismo, conectar o multilateralismo climático às pessoas e acelerar a implementação do Acordo de Paris.
Para o Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), o balanço da COP30 foi marcado por contrastes, com avanços históricos em justiça social e participação, mas um resultado final distante da urgência necessária.
Fontes: https://inesc.org.br/cop-30-termina-com-resultado-abaixo-do-necessario-apesar-de-avancos-historicos-na-participacao-social/
https://cop30.br/pt-br/noticias-da-cop30/cop30-negociacoes-apresentam-resultados-emblematicos-em-meio-a-tensoes-geopoliticas-sem-precedentes#:~:text=Por%20consenso%20de%20quase%20200,reais%20nas%20economias%20e%20sociedades.
https://ecoresponse.com.br/2025/12/01/resultados-da-cop30/
O calcanhar de Aquiles: fósseis e o financiamento
Um dos pontos mais críticos da COP30 foi a incapacidade de avançar em temas centrais de mitigação e financiamento, frustrando as expectativas de ativistas, especialistas e profissionais de diversas áreas.
A eliminação dos combustíveis fósseis (carvão, petróleo e gás) e o enfrentamento ao desmatamento ficaram de fora dos resultados formais. O documento final do “Mutirão Global” não mencionou os combustíveis fósseis, gerando críticas de organizações e movimentos.
O texto final da conferência não incluiu compromissos globais sobre a redução do uso desses combustíveis, uma resistência vinda principalmente de países produtores.

Embora a presidência brasileira tenha liderado um debate global sem precedentes sobre o futuro dos fósseis, e até anunciado a elaboração de um “Mapa do Caminho para a Transição dos Combustíveis Fósseis”, desapareceram do texto final referências a um mapa de saída dos fósseis e à eliminação de subsídios ineficientes ao setor.
Especialistas alertam que as nações ricas continuam evitando discutir como cumprirão suas responsabilidades históricas ou como apoiarão o Sul Global na substituição de petróleo, gás e carvão.
Fontes: https://www.un.org/en/climatechange/news/cop30-key-results
https://www.iisd.org/articles/insight/cop-30-outcome-what-it-means-and-whats-next
https://inesc.org.br/cop-30-termina-com-resultado-abaixo-do-necessario-apesar-de-avancos-historicos-na-participacao-social/
https://g1.globo.com/meio-ambiente/cop-30/noticia/2025/11/08/em-10-pontos-entenda-o-que-a-cupula-de-lideres-mostra-sobre-o-rumo-da-cop30-e-seus-desafios.ghtml
Justiça Climática em foco: avanços sociais e inclusão
Se as negociações formais tiveram avanços limitados, a mobilização da sociedade civil foi histórica.
Quem visitou Belém durante a COP 30, notou que a cidade se tornou palco de uma participação global inédita após quatro conferências em países com restrições à participação social.
- Protagonismo Social e Indígena
A Cúpula dos Povos, evento paralelo à COP 30, reuniu 25 mil pessoas e mais de mil organizações na UFPA, enquanto cerca de 3 mil representantes indígenas formaram uma grande aldeia na cidade.
A Marcha Global pelo Clima levou 70 mil pessoas às ruas sob o lema “A resposta somos nós!”.

- Racismo Ambiental e Gênero
Pela primeira vez na história das COPs, o tema do racismo ambiental ganhou destaque oficial. A presidência brasileira publicou a Declaração de Belém sobre o Combate ao Racismo Ambiental, um marco que une justiça racial e ação climática em um acordo internacional.
O termo “afrodescendente” apareceu em documentos oficiais relativos à Transição Justa, ao Plano de Ação de Gênero (GAP) e aos Objetivos Globais de Adaptação.
O Plano de Ação de Gênero 2026-2034 foi aprovado com conquistas importantes, reconhecendo defensoras ambientais, o trabalho de cuidados, a violência de gênero e, pela primeira vez, mulheres e meninas afrodescendentes como centrais na ação climática.
- Transição Justa
A criação do Mecanismo de Ação de Belém (BAM) foi um avanço, celebrada por ampliar a participação de povos indígenas, mulheres, comunidades locais e grupos vulnerabilizados como atores da transição justa.
O texto formal reconheceu a centralidade dos direitos humanos, dos trabalhadores e dos povos indígenas na transição.
Novos Instrumentos e Metas de Adaptação
A COP30 também produziu resultados emblemáticos na criação de novos instrumentos e metas para impulsionar a implementação do Acordo de Paris e proteger os mais vulneráveis.
- Financiamento e Florestas
Entre os compromissos financeiros, houve a sinalização de escalar o financiamento para países em desenvolvimento em pelo menos US$ 1,3 trilhão.

Um dos anúncios mais aguardados foi o Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF), uma fonte permanente de recursos para países que mantêm suas florestas preservadas, como o Brasil, a Indonésia e o Congo.
Compromissos iniciais somaram mais de US$ 5,5 bilhões, incluindo aportes da Noruega, do Brasil, da Indonésia e da França.
- Implementação e Adaptação
Em resposta à urgência climática, a COP30 adotou uma série de medidas de aceleração:
- Mutirão Global:aprincipal decisão formal marcou uma nova fase focada em transformações reais nas economias e nas sociedades.
- Acelerador de Implementação Global:lançado para priorizar ações com melhor potencial de escala e velocidade na luta climática, como renováveis e remoção de carbono por soluções baseadas na natureza.
- Indicadores de Adaptação de Belém:um avanço relevante foi a aprovação deste conjunto de métricas globais para mediras vulnerabilidades e o progresso em resiliência climática.
- Meta de Adaptação:foi estabelecido um convite para triplicar o financiamento para adaptação para países em desenvolvimento até 2035.

Em resumo, a COP30 consolidou o fortalecimento do multilateralismo climático e reforçou a centralidade da justiça climática.
No entanto, o mundo saiu de Belém sabendo que, embora tenha avançado em temas importantes, ainda está sem a ambição necessária para garantir um futuro seguro e justo, especialmente na eliminação dos combustíveis fósseis.
Fontes: https://www.reuters.com/sustainability/land-use-biodiversity/no-roadmap-end-deforestation-brazils-cop-amazon-delivered-forests–ecmii-2025-11-28/
https://www.reuters.com/sustainability/land-use-biodiversity/cop30-momentum-grows-behind-carbon-markets-climate-solution–ecmii-2025-11-28/
https://inesc.org.br/cop-30-termina-com-resultado-abaixo-do-necessario-apesar-de-avancos-historicos-na-participacao-social/
https://ecoresponse.com.br/2025/12/01/resultados-da-cop30/
Conexões estratégicas e implicações para governança corporativa
Esses temas apresentados anteriormente se interligam de modo a criar um novo “mapa de exigências” para empresas e investidores: adaptação + natureza + financiamento + transição justa. Para conselhos e comitês de sustentabilidade corporativa, isso implica:
- Revisão dos indicadores internos: adaptação, natureza, biodiversidade, direitos humanos, não mais como esboço, mas como parte integrante de estratégia de negócio.
- Integração entre áreas: risco climático, cadeia de fornecimento, finanças corporativas, governança devem trabalhar de forma coordenada.
- Antecipação de exigências: se países estão pedindo relatórios de implementação e resultados visíveis, as empresas devem estar preparadas para responder.
- Monitoramento do ambiente regulatório e de financiamento: será cada vez mais relevante para acesso a capital, seguros e parcerias de investimento.
Até a próxima e última edição do ano de 2025!